E la nave va!

Da Governança do Técnico

Como tratar da governação do IST? Os donos dISTo tudo puserem em prática uma solução discreta, amadurecida por vários mandatos com passagens de pasta de Presidentes para Vice-Presidentes, todos da mesma cor e com estratégia, tática e execução bem afinadas. Esta baseia-se nos seguintes quatro pilares.

1 – Legislação da República na forma de Decretos Lei, Estatutos e Despachos

Para enquadrar as atividade, há um conjuntos de leis a serem cumpridas. Mas há que ser prático e objetivo…

A estratégia é tomar as rédeas do IST na mão e aliviar os órgãos das responsabilidades. Começa-se pela nomeação dos de confiança para ficarem a presidir aos órgãos (CC, CP e CE) e outras posições de decisão (Departamentos, Provedoria,…). Recorre-se depois a um vasto conjunto de delegações de competências com capacidade de sub-delegação. Assim, já os donos dISTo tudo ficam com os lugares chave controlados, distribuídos por pessoas de confiança. Ou seja, tomam conta da máquina.

Se, porventura, se esqueceram de algum detalhe, até podem ter de fazer delegações com efeitos para atos pretéritos. Dá nas vistas, mas podem! Afinal de contas, são os donos dISTo tudo. Após as delegações das competências com possibilidade de sub-delegações, os apaniguados esquecem-se de prestar contas aos órgãos legitimamente responsáveis pelos assuntos. Assim, as decisões ficam em locais mais discretos e os arranjinhos podem-se fazer mais à vontade. A colaboração dos aliados de longa data e de subalternos, por vezes mais papistas que o papa, permite que se exerça o pequeno poder e se sigam escrupulosamente as ordens de cima.

A tática a utilizar é os líderes esquecerem-se (seletivamente) de alguns detalhes importantes. Por exemplo, esquecerem-se de pedir opinião ou parecer a quem se deveria pedir, de acordo com os estatutos, regulamentos e deliberações.  Até há quem desvalorize a necessidade de pedir aprovação aos membros de órgãos que estatutariamente têm essa responsabilidade, trocando-a pela suficiência da consulta a quem muito bem lhes apetece. Os de perto dizem sempre que sim e os amigos também.

E o que fazem os colegas da brigada do reumático que, quando vêm um “jovem” cinquentão de sucesso chegar a um posto de decisão e decidir fazer como manda a lei?… Vêm logo com a história das tradições (“sempre se fez assim”) e das dúvidas metodólogicas (“quem garante que ninguém vai impugnar esta nova forma?”)… Se se argumenta com a legislação, lá se tem de ouvir que “cada docente parece um advogado” mas que “pareceres, arranjam-se para todos os gostos.”

E, quando nalgum assunto cabeludo, em que se tem de obter pareceres em vários órgãos, se  vai alterando o que está a ser analisado, de tal forma que o que tem de ser implementado no final não é bem o que se discutiu. Os enganos, esses são sempre no sentido de fazer com que os decisores de topo façam como lhes apraz… Na Assembleia da República já houve momentos em que se constatou a relevância da mudança de uma vírgula. Aqui vai ao naco de texto que aparece, desaparece, ou é alterado porque… são os donos dISTo tudo.

Então e quando os despachos exarados por Reitores e Presidentes dos IES são aplicados depois dos mesmos terem terminado os mandatos. E se aqueles em quem foram delegadas competências, entretanto tenham também terminado o mandato? Eleitos, continuam alegremente a usar a delegação, fora de tempo. À vontadinha, que são os donos dISTo tudo…

2 – Regulamentos e Regimentos internos

Para pôr toda a gente a “piar fininho”, regulamenta-se. Farta e abundantemente. A arte suprema é governar com regulamentos em constante mudança. Alguns regulamentos com mais de uma versão por ano. Assim, vai-se torcendo o que se tem de cumprir até confundir os destinatários. Exceções e interpretação de situações não contempladas, fica desde logo escrito que são para os donos dISTo tudo. Assim fica tudo mais composto e discreto.

Ou aqueles voluntariosos, que lendo que podem ser feitos regulamentos locais, por exemplo num dado curso, metem a mão à obra. Redigem e  fazem aprovar onde de direito. Qual não é a surpresa quando, no final, ouvem os donos dISTo tudo dizer que é só seguir o regulamento geral, e não levantar ondas.

Nos órgãos, para refrear os ânimos reformistas ou contestatários, os diligentes mandaretes tratam logo cedo, no início dos mandatos, de fazer aprovar regimentos para limitar ao máximo o poder dos novos membros eleitos. Aprovações muito rápidas de regimentos, em que se copiam os do mandato anterior. E com pouca discussão. Se possível sem alterações. Muitos dos que votam logo a favor, nem os leram. É importante legitimar os velhos métodos, já com provas dadas, enquanto os novos eleitos ainda não conhecem os cantos à casa.

Começando o neófito a assistir ao desenrolar dos trabalhos no órgão, com o passar do tempo, espanta-se por verificar que não se cumpre o regimento aprovado. Nem a legislação de base. E a desculpa é para rir: “aqui é costume fazer-se assim.” E se se puser algo em causa e se tentar fazer cumprir argumentando com a lei, o argumento extremo é que o que estão a fazer “é para o bem do Técnico.” Deixa-se subentendido que quem não quiser fazer à vontade dos donos dISTo tudo, não quer o bem para o IST. Com este fantasma já se pararam muitos. Arrogância!

Se se tiver mesmo que alterar algo, nada como pedir imediatamente parecer ao Gabinete Jurídico. Dois ou três meses de atraso já ficam garantidos. E o colinho vem depois, já que o resultado será  o apoio aos métodos usados. Ou não fossem eles funcionários contratados pelos donos dISTo tudo.

3 – Atas

Há em Portugal umas leis, e.g. CPA, RJIES, em que se exige a feitura de atas nas reuniões dos órgãos colegiais… Uma chatice porque fica tudo muito exposto e a saber-se detalhes. E muitas vezes os nomes dos intervenientes aparecem, bem como as suas opiniões, o que os pode comprometer. Logo,…  a arte suprema é fazer reuniões sem atas. Assim, faz-se o que apetece e não se deixa rasto. Não fica registado quem votou, nem como. Não se tem de se prestar contas a ninguém nem de dar explicações a quem vier pedir responsabilidades ou justificações. E o tempo, trata de tornar tudo difuso e legal…

Se se tiver mesmo de fazer atas, fazem-se. Sumárias, muito sumárias. No final escondem-se bem. Pode-se apresentar uma desculpa, por exemplo o Regulamento Geral de Proteção de Dados. Mesmo quando não se aplica. Depois publicam-se umas “decisões”. Minimalistas, claro! Quando necessário, faz-se emanar dos órgãos umas deliberações, para manter as hostes todas a marchar para o mesmo lado. Aí o “ter de” e o “dever de” confundem-se, mas é de propósito.

E decisões comunicadas oralmente? Mais uma arte que não está legitimada em nenhuma lei atual mas muito praticada na casa. Foi o método preconizado nos Processos de Valorização: É usado nos Departamentos e na Comissão de Vagas do Conselho Científico, para comunicar as decisões finais. É uma limpeza. Sem deixar rasto. Se fôr bem (mal) feito, enterrando os documentos relacionados numa comissão, até se pode penalizar os incautos que reclamaram para o CC, como segunda instância. O CC do IST deve ser o único órgão consultivo no Estado Português que age como decisor científico e tribunal “penal”. E não é no plano teórico. Que o digam os colegas que tiveram as “penas” aplicadas.

Também já vi convites/ameaças veladas para ilegalidades, ou vá lá, indicações para se “fechar os olhos” a certos atos e metodologias, com fanfarronice pelo meio: “somos os melhores,” “esta atividade é única no país,” “foi muito gabada pelos nossos colegas de outras IES,” “não deitem o bébé fora com a água do banho”… Fantasmas e manipulação evidente, para fazerem como lhes apetece e sem deixar rasto. Os donos  dISTo tudo têm a máquina oleada.

4 – As outras Reuniões e Processos de Decisão

As desconformidades nos pilares legais anteriores são praticadas no dia a dia. A breve descrição das mesmas, embora ácida e um pouco jocosa, é factual. De seguida, neste pilar as provas escasseiam. Daí que se tem de dizer desde já que se vai descrever alegadamente como se pode ir ainda mais fundo na Realpolitik académica.

Quantos não receberam já uma chamada telefónica de alguém, que vos tomar uma posição contra o vontade dos donos dISTo tudo? Fora de horas e para os meios de telecomunicação privados, alguém a querer fazer aquela diplomacia de “tête-à-tête”, que limpa que se farta, e tenta chamar à razão alguma ovelha tresmalhada…

E as chamadas ou os encontros furtuitos nos corredores, ou antes ou depois de alguma atividade académica, onde é feita a sondagem sobre uma opinião ou a disponibilidade para desempenhar alguma tarefa menor… Assim as escolhas são mais discretas e as decisões menos contestáveis. Quando se dá por isso, já está tudo resolvido e uma solução a ser construída.

E aqueles orçamentos, já com 6 dígitos, que depois de muito se insistir lá aparecem. Mas com uma parcela gorda em aberto… Depois, a alocação da mesma não é clara. As decisões são tomadas no recato de algum gabinete ou por uma comissão de amigos. Sem ata, claro. E a execução não é escrutinada nem validada… Uma limpeza! Na realidade, ano após ano, não é escrutinada nem validada a execução dessa verba nem do orçamento como um todo.

Departamentos há, que para escolher um possível candidato a um cargo relevante, a ser validado por eleição, filtra antes os candidatos em reuniões de órgãos que não existem. Chama-se por exemplo os três últimos que desempenharam esse papel, alinhados com os donos dISTo tudo, e ponderam se o candidato que está a querer avançar consegue vestir o fato à medida que tem de usar. E se é trabalhador e cordato. Ou seja, mais um “yes man”.

E comissões com regras não escritas mas que “historicamente” só podem terminar por unanimidade. Aí, cada um apresenta os argumentos mais vantajosos e como não há regras, ninguém está errado e ninguém pode argumentar factualmente. É só ir convencendo os colegas. Longas e apaixonadas discussões com alianças e ataques de conveniência. No final, lá se chega a uma solução, nem que seja por exaustão. E os intervenientes estão todos comprometidos com as decisões – é a vantagem da unanimidade. Com o apelo ao sigilo, o silêncio trata do resto. E sem atas, claro. 

Há também uma técnica interessante de manipulação de audiências, a alegação da receção de opiniões, cartas, emails ou telefonemas de algum dono dISTo tudo. Não são apresentados mas que já indicam o que se deve fazer. É só seguir as indicações…

Nalguns casos de órgãos colegiais, o melhor é dizer que o órgão é consultivo. Mesmo que no estatuto ou regulamento não seja isso que diz. A deliberação a tomar com parecer obrigatório do órgão torna-se numa consulta/auscultação dos seus membros e a decisão posterior do apaniaguado que está à frente fica mais discreta. Assim, este mostra o seu poder e fica de bem com as altas esferas académicas.

“E la nave va!”
Federico Fellini, 1983.

Jorge Coelho d’Eça

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